Olá, leitores!

Tenho contato com livros desde pequena — especialmente ficção — e algo que percebi entre uma leitura e outra é como as histórias se confundem com a realidade.

Pode ser que eu esteja falando apenas por mim, mas, quando finalizo a leitura de um livro, seja aquele pelo qual me apaixonei do início ao fim ou aquele que não correspondeu tanto às minhas expectativas, é indispensável um tempo para pensar. Uma boa reflexão pós-leitura, um momento só meu, quando absorvo tudo o que foi lido e o fato de ter chegado ao fim de uma jornada. 

Caso a história seja, de fato, apaixonante, é nesse momento que experimentamos aquela sensação de solidão, de estarmos “órfãos”. 

No decorrer do tempo que levamos para absorver todas as emoções que um livro pode nos proporcionar, é comum que sintamos a certeza de que cada palavra lida aconteceu no mundo real, com pessoas reais.

Bom, no caso de histórias reais, essa sensação é mesmo certa. Mas estou me referindo à ficção que, embora sempre tenha grandes pontos baseados na realidade, ainda é uma história inventada.

O caso é que essa conexão que faz com que nos sintamos tão próximos à história sempre foi uma característica que me intrigou nas leituras. Hoje, como escritora, pergunto-me como é possível fazer com que os meus leitores experimentem a mesma sensação ao finalizar os meus livros?

Quando foi a última vez que você, leitor, sentiu tamanha empatia e afinidade com o personagem e com a história, e se identificou de tal forma? Ou, assim que terminou sua leitura, sonhou com aquele cenário e aquelas pessoas? Acreditou, mesmo que por alguns instantes, que tudo fora real?

Personagens fortes e bem construídos causam essa sensação nos leitores, mas a dúvida é: como deixá-los tão críveis?

 

 

CONEXÃO: AUTOR VS. OBRA VS. PÚBLICO

Inicialmente, lembre-se: nossa história não vai agradar a todos! É obvio, mas necessário dizer que mesmo livros aclamados, best-sellers e premiados, não conseguem agradar boa parte dos leitores.

É por essa razão que, quando escrevemos, devemos nos dedicar a um determinado grupo de pessoas — ou nicho. Apenas para recordar, os nichos são definidos pelo gênero literário no qual seu original se encaixa e em suas respectivas categorias. Para saber mais, eu aconselho ler o artigo sobre gêneros textuais e gêneros literários já publicados aqui no site! (Os gêneros textuais) (Os gêneros literários)

É importante para a criação de um bom personagem que o escritor esteja conectado com a obra que está criando e com o público para o qual escreve. Facilita muito quando somos consumidores daquilo que criamos e temos um bom senso crítico a respeito do gênero. Sabemos muito bem o que gostaríamos de ver nas prateleiras físicas ou virtuais das livrarias e, dessa forma, transformamos nossas ideias em calhamaços.

Não se engane: não adianta tentar escrever sobre temas de que não gostamos ou dominamos. As chances de obtermos um resultado pouco satisfatório são maiores e, além disso, o trabalho como escritor, que deveria ser prazeroso, torna-se extenuante e não nos traz qualquer prazer.  

Sendo assim, se você gosta de romances, seja um romancista que adora ler romances e conecte-se facilmente com a história, com os leitores e com os personagens que irá criar! 

 

DANDO VIDA AO SEU PERSONAGEM

Sabendo qual é o seu público, fica um pouco mais fácil definir os traços que seus personagens devem ter para cativá-los. 

Todos nós pertencemos a um determinado grupo de pessoas. Seja um grupo de amigos de longa data, um grupo da igreja, um grupo de jogadores, torcedores, etc. Por vezes nos moldamos para experimentar a sensação de pertencer, sem ao menos perceber. O caso é que sempre teremos algo em comum com algumas pessoas à nossa volta e geralmente, quando isso acontece, é o primeiro passo para nos tornarmos próximos uns dos outros.

Vínculos nascem quando partilhamos interesses. Basta que façamos um simples exercício para entender a melhor maneira de conectar seu personagem e seus leitores: pense em tudo que o fez estar próximo de pessoas ao seu redor e vice-versa. Descreva suas próprias características e as dos seus amigos e, dessa forma, entenda o que os uniu.

Tudo se torna mais claro quando nos damos conta dos pontos principais que fazem com que os vínculos surjam entre as pessoas e, manipulando esses pontos, conseguimos dar ao nosso personagem aquele toque de vida de que ele precisa para se tornar real.

 

CARACTERÍSTICAS MARCANTES

Quando falamos sobre um ser humano real, logo inúmeras características invadem a nossa mente. Pensamos em sua aparência, cor do cabelo, dos olhos, vestimentas, modo de agir, estilo de vida, gostos pessoais, entre outras diversas características marcantes.

Todos nós temos essas características, mesmo que seja difícil para nós mesmos elaborarmos uma autodescrição completa — não sei vocês, mas eu sempre tive essa dificuldade; nunca soube o que responder quando os professores pediam, no início do ano letivo, para que fizesse uma breve descrição de mim para que pudéssemos nos conhecer melhor.

Apesar dessa dificuldade, essa descrição fará com que seu personagem se aproxime cada vez mais da realidade. Sua aparência, seus gostos e sua vivência farão com que seus leitores — e até você — sintam que estão lendo a história de uma pessoa de carne e ossos, que pode aparecer diante dos olhos a qualquer momento. 

 

 

Tanto criá-los como vê-los viver aquela história será um processo muito divertido para todos! Para ajudá-los ainda mais, segue uma lista de características importantes que devemos dar aos nossos personagens para deixá-los o mais críveis possível:

•      Aparência física (formato do rosto, nariz, cor dos olhos e cabelos, manchas na pele...)

•      Estilo (como ele costuma se vestir, comportar)

•      Jeito/manias (como ele age fisicamente, possui manias ou costumes, como por exemplo sempre se sentar com as pernas cruzadas)

•      Jeitos/manias de fala (uso de gírias, maneira de falar; pode ser diferente dependendo da personagem com quem ele interage)

•      Gostos e preferencias (seja um passatempo que gosta de praticar, o grupo ao qual pertence ou preferência sexual)

•      Histórico (características marcantes do passado do personagem que influenciaram em quem ele se tornou)

•      Falhas (preconceitos, arrependimentos, defeitos...)

•      Qualidades

•      Educação 

•      Necessidades e sonhos

Esses são apenas alguns exemplos, lembrando que nem sempre haverá necessidade de descrever todos esses pontos diretamente, o que nos leva ao próximo tópico.

 

AQUILO QUE NÃO PODEMOS VER

Nem sempre nos damos conta, de imediato, de como todos nós somos complexos. Todos temos uma história, vivência, sentimentos, manias, pensamentos bons e ruins. Todo esse conjunto de fortes características nos molda dentro de nosso contexto.

Claro, é uma tarefa muito difícil trazer toda essa bagagem para um personagem em tão poucas páginas. É por isso que devemos nos atentar não só às características básicas de um personagem, como também nas características que nem sempre estarão escritas, mas que estarão ali presentes e que o leitor perceberá, mesmo que você não diga. 

Por exemplo, se eu estou escrevendo um romance e preciso demonstrar um sentimento como ciúme, é muito mais interessante fazer com que o meu personagem viva uma autodescoberta de tal sentimento através do próprio comportamento do que apenas dizer como ele se sentia. Nem sempre nós temos a capacidade de dizer tudo o que sentimos com clareza e de imediato, afinal.

O crescimento emocional de um personagem ao longo de uma história é a viga de sustentação da sua obra, sempre caminhando com os objetivos e motivações do personagem.

Ao escrever um livro, você, autor, quer passar uma mensagem e demonstrar, através daquelas palavras, uma evolução, uma descoberta, uma lição importante vivida por aquelas pessoas. Perceba que, no fim, toda a profundidade de um personagem estará completamente integrada a história e a evolução dos envolvidos os levarão para o fim — ainda usando o exemplo do ciúme sentido por um personagem, ele provavelmente aprenderá o que está sentindo depois de passar por um conflito, identificará a melhor maneira de lidar com aquele sentimento e, por fim, resolverá os problemas que surgiram por causa dele, o que demonstrará a sua evolução. 

Caso você esteja pensando que é uma tarefa fácil recriar tal complexidade em seus personagens, reconsidere. Existem inúmeras facetas por aí e dificilmente todas elas já foram registradas. Ao longo da carreira, percebemos que a produção de personagens autênticos parece se tornar cada vez mais difícil conforme “esgotamos” nossa criatividade. É por essa razão que eu aconselho que nunca deixem de estudar sobre o que você fala! Ou seja, caso falemos sobre seres humanos e seus sentimentos, continuemos estudando sobre eles e aprendendo as várias formas de ser e sentir.

Não menospreze a ficção, pois ela também significa estudo e trabalho contante!